quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

"Melhorismo da continuidade"????

Na revista Caros Amigos, de janeiro de 2010, João Pedro Stédile escreve uma matéria intitulada "É preciso debater um Projeto para o Brasil". Inicia afirmando que a opção brasileira não deve ser entre o "retrocesso da volta dos tucanos" ou o ""melhorismo" da continuidade".Defende que a situação dos pobres só vai melhorar com "mudanças estruturais" que viriam com a elaboração de "um projeto para o país". Afirma que é preciso que "se conscientize as massas, aglutine forças e motive o povo a lutar por ele".
A seguir cita o desemprego, a concentração da terra e da renda e segue listando tudo o que falta melhorar na realidade brasileira.
Ouço e leio o Stédile e as esquerdas brasileira dizerem isso a 30 anos e esse é, mais ou menos, o tempo em que João Pedro coordena o MST, o maior movimento organizado de luta pela terra nas Américas.Penso que ele já deveria ter percebido, que o discurso da "conscientização", do "acúmulo de forças" e da formação de lideranças (quadros dirigentes), que debatam e formulem Projeto ou Projetos para a diversificada realidade brasileira, não foram suficientes para realizar mudanças estruturais, porque é isso que o MST, a Via Campesina, os Movimentos Sociais Populares teem feito a décadas. O que faltou fazerem? Como fazer isso de forma a dar resultados diferentes agora? Que mudanças estruturais são essas?
Talvez ele queira dizer que é preciso derrotar o capitalismo e implantar outra coisa (o socialismo). Mudanças estruturais sugere mudanças na política econômica (intervenção nos bancos, estatização de setores da economia, redução de juros, não subordinação à lógica financeira global,reforma agrária massiva, etc.)Será isso?
O que confunde a esquerda e a direita fascista, foi o Governo Lula ter enfrentado a crise econômica, que assolou o mundo e o Brasil, sem fazer mudanças econômicas ortodoxas,e sim fazendo políticas sociais, distribuindo renda, em programas sociais, colocando nas mãos dos pobres, recursos que lhes deram acesso ao mais fundamental. Se é a vida que produz riqueza, é da vida dos mais pobres que Lula cuidou. Fortaleceu o mercado interno e fez o efeito da "multiplicação dos pães" na economia.
Mas na interpretação das expressões "mudanças estruturais" e "acumulação de forças", me induz a pensar na idéia de tomada de poder do Estado e então realizar as mudanças. Por outro lado "acumular forças" sugere que a forma de tomada de poder é ir construindo maioria nas estruturas estatais e institucionais e hegemonia de pensamento através da conscientização, realizada sob a coordenação de lideranças políticas e quadros bem formados. Já ouvi isso muitas vezes. Isso é o que já se tentou fazer. Por que não se fizeram mudanças? Porque o Lula traiu o povo e fez só "melhorismos"? Certamente que não.
João Pedro, muita coisa mudou:
- o latifundio já não é tão improdutivo;
- o crescimento econômico já não gera tantos empregos;
-o Presidente não tem o poder que se pensava ter.
Veja o caso das desapropriações. Acabei de ler, na mesma revista acima citada, que o Presidente Lula assinou o decreto declarando área de interesse social, para fins de Reforma Agrária, a área da Fazenda Monte Cristo, no Vale Jequitinhonha, no norte de Minas. Essa assinatura é o último passo para a desapropriação. Pois a fazenda está sendo vendida, com o consentimento do Ministério Público Estadual. Os conflitos são acirrados, morre gente e nem o Presidente conseguiu desapropriá-la.
O Estado não é o Presidente e o Sistema Capitalista é maior que o Estado. É necessário, sim, neutralizar ao máximo a força repressiva do Estado e por isso faz diferença escolher entre Lula e o PSDB e seus comparsas.
No entanto, o MST e o Movimento Popular e Sindical, precisam avançar em suas estratégias de luta.
Em lugar de conscientização, propor, organizar e realizar ações que inaugurem novos modos de vida,: com mais autonomia, menos dependência, subordinação e hierarquização. Novos modos de produzir,novas formas de trocas, de uso da moeda, de morar, de garantir segurança. Produzir comunicação, informação, lutar pela acessibilidade de tudo o que humaniza e dá qualidade de vida digna.Não no discurso, na prática, na vida, em ações concretas. Muitas coisas nesse sentido estão acontecendo, é preciso que os dirigentes dos movimentos populares vejam isso. Algumas o MST já faz, é verdade.
A Reforma Agrária, por exemplo,precisa ser feita com linhas de crédito para grupos cooperados, organizados em Projetos com o objetivo da Segurança Alimentar, com assessoria técnica, gerenciamento cooperado, visando boa e sustentável produtividade. Continuar defendendo lotes individuais, para integrarem-se a um tipo de mercado, em que o pequeno quase sempre vai à falência, com qualidade de vida péssima, sem acesso à formação, comunicação, saúde, cultura, não dá mais. É preciso reinventar a luta, reinventando a maneira de viver. Não é o Bolsa-Familia que impede a formação de novos acampamentos, é o sacrifício, o sofrimento, a humilhação e o medo que impera sob as lonas pretas. Acorda coordenador do MST!

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