quinta-feira, 24 de junho de 2010

De repente


De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
(Vinicius de Moraes)

Foi de repente que todos nós: marido, filhos, irmãos, cunhados, sobrinhos e amigos,
fomos surpreendidos com a notícia, assustadora, de que nossa amada amiga Marilene Dalmaso Coelho, iria fazer uma cirurgia decisiva: tinha câncer na visícula.

No dia primeiro do ano, ela estava conosco no Rincão de Lurdes, em Caçapava, celebrando com os familiares, cantando, ajudando, rindo, gargalhando.
Em janeiro na praia. Em fevereiro ajudando limpar o terreno para ampliação da casa( um sonho que começava a se realizar). Queixou-se de dor nas costas, poderia ser de fazer força: não fugia do trabalho. Mas não era de fazer força.

E de repente soubemos, e percebemos logo, que só um milagre poderia salvá-la. A nossa medicina pouco podia fazer.
A familia e todos nós, agarramo-nos à esperança de terapias alternativas. Tudo foi feito.

Em março a cirurgia, em 22 de junho, pegamos em sua mão, ouvimos sua voz fraquinha, a nos dizer" que bom, que bom".. (ver-nos) quando a visitamos. Vimos, pela última vez, as lágrimas silenciosas escorrerem no canto dos seus olhos. Vimos ela sair na, maca, rumo ao Hospital e no mesmo dia, ela disse, pela última vez, ao marido e a um dos filhos:" estou bem". Foi a última expressão em vida.

A Marilene era uma mulher linda, alta, forte, alegre, vigorosa. Quando chegava, iluminava o ambiente com seu sorriso, com suas gargalhadas bem-humoradas. Tinha habilidade com as palavras, com as pessoas, com os problemas: era sábia.
Quando encontrava as pessoas, abria bem os braços e abraçava forte. Era acolhedora.
Tinha muitos amigos e era muito conhecida: 30 anos professora. Cultivou muitas e sinceras amizades: colegas de faculdade, colegas de magistério, irmãos de sua comunidade, familiares.
Na despedida, foi uma multidão de pessoas que se despediam.

Ouvi tantas afirmações que me faziam pensar. Alguns falavam que ela tinha cumprido sua missão na terra e que seu espírito estava pronto, não mais reencarnaria. Outros falavam:" onde quer que esteja, ela está feliz"! Ou ainda: "ela se reencontrou com seus pais e irmãos, que partiram antes dela".
"Ela estará olhando por nós, seus amigos".
Tantas crenças reveladas nessas expressões!

Eu pensava, que não importa se verdade ou não,( isso depende de fé e deve ser respeitado) ela estaria entre nós, pelo que ela viveu com todos nós.
Minha dor foi constatar, que uma doença pode ser tão destruidora, capaz de consumir 60 anos de crescimento, de energia, de forma tão rápida e tão avassaladora.
Tão rápido ser capaz de retirar toda a beleza daquele corpo, que fora tão belo e tão vigoroso. De repente, ela desapareceu, tão de repente!

Mas a beleza da Marilene a doença não retirou, até o fim ela foi capaz de ser amável, gentil, generosa. Até o último momento, preocupava-se em não causar desconforto e sofrimento a ninguém. Tão serena e confiante, tão paciente!
Não importa se tem ou não outra vida, a Marilene deixou vida se multiplicando, dando frutos.
Ela era a mais jovem, a caçula e era na casa dela que os familiares buscavam abrigo, diante das doenças e dos problemas. Acolhia, ajudava, testemunhava sempre acolhimento e solidariedade. Isso é eterno, isso é a ressurreição!

Foi doloroso ver as irmãs idosas cuidar da caçula (em meio às lágrimas) e depois velar a irmã. Meu Deus, foi muito sofrido e comovente! Comovente, também, os cuidados, a esperança, as pesquisas dos familiares, para tentar segurar a vida da amada.
Jamais, enquanto viver, vou esquecer a minha querida cunhada Marilene. Aprendi muito com ela.
Sentiremos muitas saudades.

5 comentários:

  1. Que bom poder ir para outro plano deixando tanta saudade, tanta coisa realizada,tantos amigos,família...
    A ida da Marilene me faz pensar o que eu deixarei, será que alem de meus irmãos e filhos alguem mais sentirá minha falta?
    Terei eu deixado algo de bom para o mundo como a Marilene deixou?
    Claro, não queremos perder quem amamos,mas acho que não perdemos, não no caso da Marilene pois Ela deixou um legado em sua familia , seus amigos, deixou uma enorme saudade, boas lembranças, de alguma forma sua presença...
    Infelizmente não estamos nunca preparados para a coisa mais certa da vida por que somos egoistas, pensamos somente no sofrimento de nós que ficamos.
    Aos que ficaram, muita coragem, força para enfrentar esta perda.
    Eliza

    ResponderExcluir
  2. Teu texto é uma bela homenagem a tia Marilene. Saúde e força pra toda a família...

    ResponderExcluir
  3. Fiquei muito triste ontem quando soube do falecimento da Marilene. Fui colega do Coelho no Maneco por muitos anos, fui professora de Inglês de um filho deles, que no momento ,lembro de seus cabelos crespinhos e claros ,lembro da Marilene junto ao Coelho, bonita, elegante,sorridente marcando presença.Me pergunto , como uma pessoa assim pode ir...? Mas a resposta vem logo: Nosso Pai ,lá em cima, precisa de pessoas como ela para lhe ajudar. Meus profundos sentimentos ao Colega Coelho e familiares. Lamente ficar sabendo apenas ontem. Um abraço fraterno pra todos vocês que neste momento de dor. Rosa Maria Ramos

    ResponderExcluir
  4. Obrigada por tuas bonitas palavras. Transmitirei ao Marco.

    ResponderExcluir