segunda-feira, 6 de junho de 2011

EXPERIÊNCIAS DE VIDA

Hoje faz uma semana que fiz a minha 9ª cirurgia: foi tudo bem. Quanto mais velha fico, mais se acentua em mim o estranhamento em relação a diversos procedimentos adotados na nossa sociedade, especialmente em relação às rotinas hospitalares.

Se por um lado, a tecnologia nos proporciona cirurgias por vídeo, sem aqueles rombos devastadores no corpo e com pouco sangue e pouca dor, por outro continua tratando as pessoas como "pacientes".
Ninguém protesta porque é bom ser acolhido, ser cuidado, ter pessoas se ocupando da gente.

Fui fazer uma pequena cirurgia preventiva (retirar a vesícula que continha um pólipo que poderia vir a se transformar em coisa maligna, com o tempo). Fui de ônibus, com uma pequena mochila, gozando de perfeita saúde, física e mental (essa é sempre duvidosa).
Mesmo assim, tive que baixar e aguardar num quarto. Quando a hora se aproximava, tive que retirar toda a roupa e vestir uma camisola grossa, de algodão, aberta atrás (para mostrar a bunda com facilidade).

É a indumentária da humilhação! A gente fica despotencializado vestindo SÓ aquilo, cuidando pra não mostrar o trazeiro para os outros habitantes do quarto (semi-privativo) e para toda a equipe da enfermagem.
Daí fui ao bloco cirúrgico de maca, deitada de costas, sem travesseiro, já pronta para o "matadouro". Poderia ter ido caminhando, pois não estava enferma, ainda.

Fui muito bem tratada, é claro, não posso me queixar. O médico muito carinhoso (meu irmão) e competente.
Toda a linguagem do pessoal é no diminutivo, tipo: remedinho, bracinho, perninha, fica sentadinha, deitadinha, etc.
E não explicam nada. Eu pergunto, mas as respostas são do tipo: "é assim mesmo, é o procedimento", etc.

Me invoquei com a falta de lembrança minha sobre a anestesia. Vi quando colocaram o soro e pensei em fazer uma pergunta sobre o oxigênio que aproximaram da minha boca e apaguei repentinamente, não me deu aquele soninho breve antes de apagar. Pensei em fazer uma pergunta e quando acordei eu já estava na sala de recuperação com outras pessoas, em outro ambiente. Ou seja: fiquei totalmente entregue aos cuidados de pessoas, a maioria, que não me conhece.
É preciso confiar na responsabilidade e profissionalismo de uma equipe de gente que precisa trabalhar coordenadamente. Ninguém pode falhar. Se alguém falhar, um medicamento pode ser trocado e pode ser o fim.
Por tudo isso eu fico perplexa e grata por estar aqui escrevendo essas impressões, sã e salva, graças à responsabilidade de cada uma daquelas pessoas.

Estou pronta para agitar: já fui refletir com a turma do DCE que prepara as eleições da UNE, e adorei a marcha das VADIAS. Se houver qui eu vou.
Uma reação criativa das mulheres contra o machismo. Ora, ter homens (políticos) que acham que a culpa dos estupros contra as mulheres (e meninas) é das mulheres que usam roupas decotadas, é o cúmulo. NADA justifica a violência e o desrespeito e cada um usa o que quiser. Os homens não andam muito à vontade sem camisa e de tanga?

Alguns, acho, gostariam que usássemos burca. Imaginem aparecer o tornozelo sob a burca: algum tarado poderia ficar excitado e justificar o estupro. Ora, como diz Paulo Freire," quem não resolveu minimamente suas questões afetivas e sua sexualidade, não pode conviver com pessoas".
Adorei a reação da mulherada e estou achando muito bom o movimento da juventude em diversos lugares do mundo: dos jovens na Espanha, contra as medidas neoliberais que retiram conquistas sociais da população. No Oriente também foram os jovens que puxaram as diversas lutas contra as ditaduras. O importante a assinalar que não é uma luta para tomar o poder, sob comando de partidos ou sindicatos. São manifestações pela qualidade de vida, por liberdade, contra preconceitos, etc. e que são chamadas principalmente através das redes sociais (internet) e celulares. Sinais dos tempos!
Parece a prolongação do Mov. de 1968, contra as guerras, contra o racismo, contra o machismo, pela defesa do meio ambiente, pela liberdade no trabalho, etc.

Claro que ao mesmo tempo a gente vê manifestações muito conservadoras. É uma luta e viva a democracia das multidões!

2 comentários:

  1. Quando falaste de certa humilhação do hospital foi impossível não lembrar de Vigiar e Punir, do Foucault,né? Até essa "bunda de fora" faz parte de uma esfera de poder, de submissão e disciplinamento. Mas, tá viva,não tá?Isso que importa!hehehe

    ResponderExcluir
  2. Tens razão Alice, lembrei também da sociedade disciplinar.Obrigada por escrever.

    ResponderExcluir